Teoria dos 5 Elementos: aspectos históricos e filosóficos por Ana Varela e Lurdes Carvalho


A Prof. Ana Varela e Prof. Lurdes Carvalho são docentes na ESMTC há mais de 10 anos.

«A Saúde não é um estado mas um processo permanente de busca de equilíbrio dinâmico de todos os factores que compõem a vida humana» – Leonard Boff (1999)

Os termos elemento e movimento podem não ter o mesmo significado. Mas se perceber qual é o conceito chinês, poderá usar qualquer um deles.

A compreensão e o conhecimento da teoria dos 5 movimentos é essencial para entender as relações entre o Homem e o Universo, bem como as relações entre os diferentes órgãos e sistemas energéticos que o constituem.

Através da aplicação da teoria do Yin e do Yang e da teoria dos 5 movimentos à Medicina Tradicional Chinesa, é possível compreender porque é que a saúde implica a maior parte das vezes saber conviver com a doença, com o sofrimento, no melhor equilíbrio possível.

A gestão deste equilíbrio compete, em parte, ao terapeuta de MTC e implica o conhecimento das fragilidades e potencialidades das relações energéticas existentes entre os diferentes órgãos e destes com um envolvimento particular. Implica também a compreensão e o conhecimento do modo como se transmite àquele de quem se trata, o significado destas, no cuidado com a vida que o anima.

O aspecto histórico e filosófico da Teoria dos 5 Elementos-Movimentos

O termo chinês que designa os 5 elementos ou movimentos é Wu XingWu significa “cinco” e Xing “movimento”, “processo,” “ir”, ou ainda “comportamento, conduta”. Deste modo, alguns autores referem que a palavra Xing não pode indicar “elemento”, enquanto um constituinte básico da natureza, tal como é supostamente entendido na filosofia grega. Mas, os autores que defendem aquela tradução, referem que é possível haver uma ligação entre o conceito de elemento na filosofia grega e na chinesa, dado que os filósofos gregos concebiam os elementos como qualidades dinâmicas da Natureza.

Para alguns autores (Gomes et al., 1993) traduzir Xing por elementos é errado, dá uma impressão estática, associado aos quatro elementos da filosofia grega, mas que se referem a conceitos totalmente distintos dado que estes não se fundem, tal como são entendidos pela MTC.

Por outro lado, por exemplo, para Aristóteles, os quatro elementos que considerou na sua teoria – terra, fogo, ar e água – tornavam-se nas qualidades do mundo natural – seco, quente, frio e húmido – as quais se podiam transformar umas nas outras e gerar-se mutuamente. De acordo com Maciocia (1989) esta interpretação é muito semelhante à da filosofia chinesa, na qual os 5 elementos representam qualidades da natureza, pelo que segundo este autor é possível traduzir a palavra Xing quer por elementos quer por movimentos, entendidos do modo como foi referido. Ou seja, os 5 elementos não são constituintes básicos da natureza: são 5 processos básicos, qualidades, fases de um ciclo ou capacidades inerentes de um fenómeno em transformação.

No âmbito desta discussão parece importante entender o significado do caracter Xing de acordo com Ribaut (1999):

Explicação do símbolo Wu Xing

 

Wu (cinco)

Xing (alvo; cruzamento, pé esquerdo + pé direito; mudança de ritmo na marcha, agir; conduta, direcção, agir).

Wu Xing– significa portanto os cinco agir, direcções, condutas, processos, tal como se indica inicialmente.

Desenvolvimento Histórico de acordo com Maciocia, 1989

A teoria dos 5 elementos não foi aplicada à Medicina Chinesa pelo seu desenvolvimento histórico, mas pela sua popularidade, ganha através dos séculos. Durante o período dos Reinos Combatentes a teoria dos 5 movimentos torna-se imensamente popular e é aplicada à medicina, astrologia, ciências naturais, calendário, música e mesmo à política. A sua popularidade foi tal, que a maior parte dos fenómenos eram classificados em 5 grupos. Contudo, perto do século I a.C. levantaram-se várias críticas, principalmente com o filósofo Wang Chong (a.C. 27-97), a esta maneira rígida de interpretar os fenómenos naturais.

A partir da dinastia Han, a influência da Medicina Chinesa começa a ganhar terreno. Maciocia (1989) refere, como exemplo, que a grande obra médica clássica da dinastia Han“Tratado das Doenças Febris -induzidas pelo Frio”, escrita por Zhang Zhong Jing, não faz qualquer referência à teoria dos 5 movimentos. É só a partir da dinastia Song (960-1279) que a teoria dos 5 movimentos reconquista a sua popularidade e é aplicada sistematicamente ao diagnóstico, sintomatologia e tratamento na Medicina Chinesa.

Na dinastia Ming (1368-1644), a influência desta teoria volta a decrescer, dado que nesse período a MTC era dominada pelo estudo das doenças infecciosas, devidas ao Calor externo, para o diagnóstico e tratamento das quais era utilizada a identificação dos padrões de acordo com os 4 níveis energéticos e com os três aquecedores.

Hoje a teoria dos 5 movimentos continua a ser essencial para o diagnóstico e tratamento na MTC, permitindo muitas vezes esclarecer ligações mais escondidas na análise dos sintomas do paciente.

Os 5 movimentos na Natureza

A teoria do Yin e do Yang antecedeu a dos 5 movimentos. A primeira referência ao Yin-Yang remonta à dinastia Zhou (cerca de 1000-770 a. C.) enquanto o primeiro registo da teoria dos 5 movimentos data do Período dos Reinos Combatentes (476-221 d.C).

Pode dizer-se que a aplicação da teoria dos 5 movimentos à MTC marca o princípio do que podemos chamar a Medicina Científica, e o afastamento do Chamanismo. O homem deixa de procurar as causas das doenças no sobrenatural. O homem passa a observar a natureza e, através da combinação do método indutivo e dedutivo (de acordo com Maciocia, 1989) ou analógico (de acordo com Choy, 1998), passa a procurar padrões de mudança dentro da mesma e, por extensão, a aplicá-los na interpretação da doença.

Não é portanto por acaso que os números e a numeração são aplicados de forma crescente na interpretação da natureza e do corpo humano: duas polaridades básicas (Yin-Yang), uma “estrutura” cosmológica dividida em três partes (Céu, Homem, Terra), as quatro estações, os cinco movimentos, os seis climas (energias), os cinco órgãos Yin e oa seis órgãos Yang. O número 5 e os 5 movimentos são associados aos fenómenos terrestres, e o número 6 aos fenómenos celestes.

No I Jing o número 5 é a junção entre o céu anterior e o posterior, entre o projecto e a realização, é também um número ímpar, indicando que é operador do projecto/movimento (Ribaut, 1999). Deste modo o número 5, contrariamente ao número quatro, indica também por sua vez movimento.

O Livro “Shang Shu” escrito durante a dinastia Western Zhou (1000-771 d.C) diz: «Os 5 movimentos são: Água, Fogo, Madeira, Metal e Terra.» A teoria dos 5 movimentos foi desenvolvida pela mesma escola que se ocupou da teoria do Yin-Yang, ou seja, a escola do Yin-Yang. O expoente máximo dessa escola foi Zou Yan (350-270 d.C.).

Inicialmente a teoria dos 5 movimentos tinha tantas implicações políticas como naturalistas. Os filósofos desta escola eram muito estimados, e até de certo modo temidos, pelas autoridades chinesas antigas, dado que eram capazes, através da teoria do Yin-Yang e dos 5 movimentos, de interpretar a natureza e tirar conclusões ou ilacções políticas das mesmas. Por exemplo, associavam um governante a um movimento e eram capazes de prever a sua sucessão através do ciclo dos 5 movimentos, etc.

Para além da sua faceta política, a teoria dos 5 movimentos representa 5 qualidades diferentes dos fenómenos naturais, e 5 fases do ciclo das estações que importa conhecer.

 

Autoras:

Prof. Doutora Ana Varela e Prof.a Dra. Lurdes Carvalho