Chi Kung na Infância por Margarida Sá Domingues


Annual Report 2017/2018 Helping little people achieve their dreams (artigo consultado em 13/03/2019

Chi Kung na Infância por Margarida Sá Domingues

A Margarida Sá Domingues é formadora do Curso de Instrutores de Chi Kung Terapêutico da Escola de Medicina Tradicional Chinesa

Ser criança é viver em constante mudança! É ter uma mente e um corpo que crescem continuamente, expostos a muitos estímulos externos como o stress dos adultos, o excesso de estímulos electrónicos, aliado a menos tempo para brincar. Tudo isso propicia uma menor ligação da criança ao seu corpo físico, emocional e mental, o que leva a uma maior dificuldade em ter consciência de si própria e das suas emoções em relação ao mundo exterior.

WEHRY, Christina. Mindfullness based training improves anxiety in children (artigo consultado em 13/03/2019)

 

Nos últimos anos assistiu-se a um aumento da hiperatividade nas crianças e jovens, dificuldades de concentração, baixa do sistema imunitário, menor resistência física, menor flexibilidade e comportamentos conflituosos ou mesmo violentos. O Chi Kung contribui efectivamente para melhorar todos estes parâmetros.

No mundo actual existe uma pressão cada vez maior, são os rankings escolares, a necessidade de ter avaliações cada vez mais altas para alcançar um futuro melhor, o que determina uma grande competição em todas as áreas da vida. Urge capacitar as crianças com saberes relacionados com a gestão do stress, para poderem manter a paz interior e encontrar soluções para os mais diversos desafios que lhes vão surgindo na vida. É por tudo isto que a prática do Chi Kung é tão importante.

 Ao longo de nove anos de prática de Chi Kung com crianças entre os três e os dez anos de idade, na Escola Carolina Michaëlis (2007/2016), em Lisboa, verificou-se que o grupo ficou mais calmo e atento durante o dia, houve uma redução dos conflitos e as ausências por doença diminuíram. Professores e pais referiram que as crianças pareciam mais felizes e as crianças, por sua vez, participavam na aula com gosto não querendo faltar.

Inicialmente programou-se uma prática semanal de 30 minutos mas depressa se passou com sucesso para uma prática de 50 minutos. Para motivar as crianças é fundamental criar um ambiente propício, despertar a curiosidade e executar os exercícios recorrendo à imaginação. Humor e fantasia ajudam a fomentar um bom ambiente. Para uma prática plena é importante que a criança visualize e interiorize. A visualização promove a criatividade e na expressão corporal a criança evidencia as emoções, ideias e sentimentos acerca da prática. Deve haver sempre liberdade para a criança poder exprimir as suas emoções, fundamento da comunicação com o outro.

 

Aprender através da prática e deixar que a criança vá corrigindo naturalmente a sua postura/movimento, respeitando sempre o seu estádio de crescimento e desenvolvimento é essencial.

 

Mas é preciso incentivar a realização de novos exercícios ou desafios, e fomentar a determinação em não desistir. Com a prática as crianças vão sentido satisfação em ultrapassar as dificuldades que os exercícios de Chi Kung lhes colocam. Encorajar, não permitindo que sintam medo de errar, é fundamental pois as inibições constituem um obstáculo ao desenvolvimento das potencialidades da criança enquanto ser humano. Incentivar a criança a vencer desafios é uma preparação para a vida.

 

É importante realizar exercícios diferentes e, para dinamizar a prática, incluir alguns mais divertidos.

Para o desenvolvimento da criança é essencial que tome consciência das diferentes partes do seu corpo, e aqui a prática da auto-massagem é um excelente recurso. Há exercícios que podem ser realizados individualmente, a par ou em pequenos grupos. Recorrer a diferentes materiais e explorá-los livremente ou de uma forma mais estruturada. Por exemplo, bolas de ténis para a auto-massagem e posturas de árvore, balões para as posturas de árvore, bolas de sabão ou moinhos de vento para exercícios de respiração. Na execução dos movimentos com nomes de animais resulta falar nos atributos dos mesmos e nos relacionados com imagens da natureza, como o lago, o arco-íris, a sua referência ajuda a ampliar o movimento. É necessário adaptar alguns exercícios à idade e mostrar imagens para cativar. Por exemplo, imagens de anatomia ajudam as crianças a interessarem-se mais pelos exercícios, torna-as mais conscientes do movimento, do seu corpo e da sua energia. Em muitas ajudou a melhorar a postura, principalmente os ombros curvados para a frente que quase todas as crianças já apresentam, e a melhorar a respiração.

Na prática com crianças são de incluir exercícios de respiração, auto-massagem e hétero-massagem, alongamentos, os 18 movimentos do Tai Chi Chi Kung, concentração, meditação e relaxamento.

 

Na primavera o sistema do Yi Jin Jing é muito apreciado. A postura de árvore, decididamente, é o exercício que as crianças menos gostam mas, ultrapassando o aborrecimento inicial, conseguem realizar as posturas básicas. Para algumas crianças a posição de sentar atrás representa um desafio.

Foto de Michael Jastremski (2013-10-23 09:40:52) Group Hug [imagem digital]

Por norma as crianças não estão interessadas em grandes explicações, querem logo passar à prática e são rápidas a percepcionar e a executar o movimento mas não apreciam repetir muitas vezes, querem logo um novo exercício. Com o decorrer da prática, a energia do grupo fica mais harmoniosa e as crianças mais calmas e concentradas. A partir daí a sua capacidade de repetição do movimento aumenta. Por outro lado, também não estão muito interessadas em saber o que faz bem, as indicações terapêuticas, querem apenas saber histórias e divertir-se. Mas não são necessárias histórias muito elaboradas, as próprias crianças constroem a história se sentirem necessidade disso. No decorrer da prática, as questões começam a surgir espontaneamente, umas atrás das outras! As crianças são normalmente curiosas, naturais e muito expressivas e francas nas observações.

A ligação entre corpo, emoção e mente é uma constante que se promove na prática de Chi Kung.

 

Cada criança é diferente e absorve e processa a informação de forma diferente, quer seja através do olhar, da escuta, do movimento ou do toque. Ao recorrer a diferentes estímulos ajudamos a criança a desenvolver múltiplos aspectos emocionais, mentais, corporais e espirituais. Não há duas crianças que aprendam ao mesmo ritmo e da mesma maneira, cada uma tem o seu tempo mas a prática continuada permite um equilíbrio de todo o grupo.

6 Qigong Exercises for Cultivating Healing Energy (artigo consultado em 13/03/2019)

Concluiu-se, nestes anos de prática com crianças, que o Chi Kung promove o desenvolvimento psico-motor e bio-energético, o equilíbrio e a coordenação, beneficia a capacidade respiratória e estimula a concentração e a memória.

Observou-se uma melhoria na gestão das emoções e foi uma preciosa ajuda para a criança se integrar nos diferentes grupos e desenvolver a auto-consciência e a auto-estima. Foi muito relevante constatar que, noutros momentos da sua vida, as crianças foram capazes de utilizar com eficácia as técnicas de relaxamento que aprenderam. A prática de Chi Kung promove na criança o respeito e o amor-próprio, o desenvolvimento de movimentos harmoniosos, a percepção do seu corpo e energia, e a descoberta, nos exercícios respiratórios e na meditação, de um lugar de paz e calma interior.
* Autoria: Margarida Sá Domingues, traduzido por Paula Madeira, editado e revisto por Margarida Aires
Também disponível no Blog do Curso de Instrutores de Chi Kung
Para + infos, ver também os sites: www.chikung-terapeutico.com   www.healing-project.com
Outros artigos relacionados site ESMTC: A Criança e o Chi Kung   Aulas de Chi Kung para Crianças

Yuan, Jing e Zong – O Céu, a Terra e o Ser Humano – Parte 3 (Prof. Juvenal Branco)


São 3 as energias hereditárias: a que vem do Cosmos, a essência vital do nosso corpo e a que está ligada a todos os ritmos biológicos. Descubra-as.

As 3 energias hereditárias (Yuan, Jing, Zong)

Dizer que o Ser Humano é o ponto de contacto entre o Céu e a Terra significa que é também o elo de uma cadeia que liga o infinito do Céu ao infinito da Terra. É um modo para exprimir a eternidade.

Os chineses exprimem esta ideia da vida transmitida de um ser ao outro, desde tempos infinitos, através de uma ideia dinâmica: a dos sopros hereditários ou energias ancestrais.

As energias ancestrais ou hereditárias são três, como tudo aquilo que se refere à Criação. Na numerologia chinesa, três é o número que define os meios na origem de cada Criação. Estas energias são chamadas: Yuan, Jing e Zong.

 

Yuan

Significa “o que surge”, representa o mistério da vida, aquela energia formidável que vem do Cosmos e faz com que, da união de duas células, nasça um ser vivo. É esta mesma força que preside à formação da Terra, das plantas, das estrelas, à criação do Homem, dos animais, etc.

Com efeito, Yuan é a vida que nos é dada, que tem uma duração limitada, definida e que cada ser, mediante uma certa disciplina de vida, deveria procurar levar até ao fim que lhe está fixado, sem a desperdiçar com excessos de fadiga, sentimentos, alimentos, bebidas, etc. Yuan pertence ao “Céu anterior“, que é origem e fim de cada coisa.

Jing

É a essência das coisas; é a essência vital das duas células primordiais, óvulo e espermatozóide, cuja fusão não será produtiva, senão graças à intervenção de Yuan.

Jing existe em todas as coisas e é a origem de cada coisa. É o ovo, do qual emana cada vida, que será mantida pela indução dos outros jings, provenientes tanto da alimentação como da respiração. Contrariamente ao yuan, que é energia pura, jing representa a matéria-prima, indiferenciada, o material de base de cada coisa, a substância fundamental, da qual será formada cada célula do nosso corpo. Porém, só será vital depois depois de ter sido animada pela energia vital yuan. Jing tem a sua origem no “Céu anterior” e mantém-se activo graças ao “Céu posterior“.

Zong

O ideograma que representa Zong significa “ancestral”. É representado pela hereditariedade transmitida de pai para filho. Porém, não se trata somente de uma hereditariedade no sentido biológico do termo, que se traduz por um certo aspecto tipológico, fisiológico ou patológico. Zong é também o que faz com que um ser pertença a uma raça, a um clã, a uma família, com hábitos, costumes e modos de ser. Por isso, Zong está ligado, no corpo, a todos os ritmos biológicos e, em particular, aos mais visíveis, que são a respiração e a circulação do sangue. Zong pertence ao “Céu posterior”. Provém dos progenitores e vai sendo mantido activo no corpo, graças à alimentação e à respiração que têm uma importância essencial na manutenção das características vitais.

 

Prof. Guilherme Juvenal Branco, acupuntor e especialista de Medicina Tradicional Chinesa, precursor da Dietética Chinesa em Portugal (revisão equipa ESMTC, 2020)

 

Ler também

As origens do Chi - O Céu, a Terra e o Ser Humano - Parte 1 

As origens do Chi - O Céu, a Terra e o Ser Humano - Parte 2